Tomar café da manhã está pesando mais no bolso do brasileiro. Isso porque, além do reajuste do leite, o preço da manteiga disparou e fez o produto sumir das gôndolas dos supermercados no País. Segundo o Índice de Preços do Consumidor Amplos (IPCA), o produto segue em alta, apesar da recente deflação. Nos 12 meses encerrados em setembro, o preço da manteiga subiu 23,5%, mais de três vezes o índice geral para o período, que ficou em 7,17%.
Para especialistas do setor, os preços mais altos e sumiço nos supermercados são reflexo da união de fatores como a Guerra na Ucrânia e pelo fenômeno meterorológico La Niña, que intensificaram o que seria apenas um problema sazonal da entressafra. Essa falta de produto geralmente ocorre quando o pasto fica mais seco, e os produtores precisam aumentar o uso de ração para alimentar o rebanho.
Segundo Ana Paula Negri, pesquisadora de insumos agropecuários do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da USP, a produção de leite no País entra no seu período de entressafra entre abril e setembro, já que no outono e no inverno o clima é mais seco. De forma geral, a substituição do pasto pela ração costuma resolver a questão. No entanto, a situação da pastagem foi agravada neste ano pelo fenômeno La Niña, que deixou os campos ainda mais secos, exigindo o uso de outras formas de alimentação.
Ao mesmo tempo, o mundo sentia os reflexos macroeconômicos da guerra entre Ucrânia e Rússia. O embate no Leste europeu fez o preço das commodities disparar no mercado internacional, pressionando o valor das rações bovinas, feitas à base de milho e soja, explica André Braz, economista da Ibre/FGV. “A entressafra acontece todo ano, é um problema sazonal. Mas a guerra se transformou em um elemento surpresa para os produtores no mesmo período”, afirma.
Outro agravante, segundo o economista, foi a desvalorização do real ante o dólar. Como os insumos para ração são comercializados em moeda americana, os produtores de leite brasileiros sentiram ainda mais esse impacto nos preços.
Menos gordura à disposição
Além de encarecer o custo total da produção, a substituição feita na alimentação dos animais, de pasto por ração, ainda traz como efeito a redução na quantidade de gordura na composição do leite. É aí que a situação dos fabricantes de manteiga se agrava, como explica especialista do Cepea USP. “O gado está acostumado com a pastagem. Quando ele é alimentado com ração, o nível de gordura do leite cai bastante. Assim, é preciso muito mais leite para produzir a mesma quantidade de manteiga”, afirma. “Basicamente a produção de manteiga usa um único produto: o creme de leite, ou seja, a parte de gordura.”
Essa queda no porcentual de gordura do leite na entressafra fez a produção de manteiga cair no País, levando à falta nos pontos de venda. No caso da Aviação, a falta de creme de leite teve impacto direto na produção do seu principal produto, com uma queda de cerca de 30% nos últimos meses. O presidente da empresa, Roberto Rezende, conta que o preço da matéria-prima, durante o período de seca, subiu até 40%. “O pior é que nós não conseguimos repassar esse ajuste para o consumidor”, afirma.
Para o executivo, o mercado brasileiro ainda não tem capacidade de produzir a quantidade de creme de leite necessário para garantir o abastecimento de manteigas, sem interrupções durante os períodos de maior crise, como a entressafra. Hoje, para manter a fabricação do seu principal produto, a Aviação negocia a matéria-prima com cerca de 40 produtores pelo País.
Escolha dos produtores pelo UHT
Além do leite mais “magro”, os negócios de manteiga enfrentaram mais uma questão: a preferência dos produtores de leite em vender a matéria-prima para fabricantes de leite UHT, aquele de “caixinha”. Ao mesmo tempo que a manteiga ficava mais cara, o preço da caixa de leite UHT também disparava nos supermercados. Em julho deste ano, no pico da entressafra, o preço do leite chegou a subir 66%, de acordo com a inflação pelo IPCA.
Quem sentiu menos essa dificuldade de acesso à matéria-prima foram os negócios que processam mais produtos à base de leite, como a Piracanjuba, que, além de manteiga, também fabrica leite UHT, leite condensado, creme de leite e queijos, entre outros.
O vice-presidente da companhia, Luiz Cláudio Lorenzo, diz que a empresa também sentiu o problema no período de seca, mas, por ser o terceiro maior captador de leite no País, conseguiu mitigar a situação e controlar a queda no faturamento durante o período de carestia do leite. “Nós estamos na nossa capacidade máxima de produção. Somos beneficiados por termos uma maior facilidade de acessar a matéria-prima. Mesmo assim, reduzimos 3% a produção”, diz.
Braz, da FGV-IBRE, aponta que a situação da produção de leite no País deve ser normalizada até o fim do ano, já que os próximos meses devem trazer mais chuvas, ampliando a disponibilidade de pasto para o gado. “A primavera e o verão são períodos mais generosos para a produção de leite no Brasil”, diz o especialista. Para o consumidor final, redução nos preços da manteiga deve vir só no começo do próximo ano, diz o especialista.
Puxando o preço
Enquanto o preço da manteiga nas gôndolas aumentava, o preço da margarina também subia, mesmo o produto alimentício não levando leite em sua composição. O economista da FGV explica que, por se tratar de um substituto direto da manteiga, a margarina também subiu. “O preço sobe por causa do efeito substituição. As família fazem a troca e ambos os produtos encarecem nos supermercados”, diz Braz.
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