Sedã volta a ser importado, mas fica tão caro e refinado que não tem mais o Toyota Corolla como grande concorrente Honda Civic e Toyota Corolla travam uma disputa de gato e rato há mais de 50 anos. Por aqui, não poderia ser diferente. Apesar de a Toyota ter flertado com a produção nacional do Corolla nos anos 1970, os japoneses só desembarcaram aqui com seus sedãs nos anos 1990. Pouco tempo depois se tornaram nacionais – e quase vizinhos. A Honda se instalou em Sumaré e a Toyota em Indaiatuba, ambas no interior de São Paulo. Falar de Civic é também falar de Corolla. E vice-versa. Ou era.
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Pois o mais recente capítulo é escrito por um Honda Civic muito diferente. E com diferente, não me refiro a uma possível ruptura no design, como fez a oitava geração em 2006. O Civic 11, que acaba de ser lançado, é híbrido pela primeira vez. E, como no princípio de sua história no Brasil, chega importado. Há apenas uma versão disponível, que custa R$ 244.900. Por tudo isso, também é possível dizer que, de forma inédita, Civic e Corolla não serão rivais diretos em nosso mercado.
Os dois são híbridos, mas com tecnologias bastante distintas. Como esse texto é sobre o Civic, vamos deixar o Corolla um pouco de lado. O sistema da Honda é conhecido como e:HEV, esteve presente no Brasil durante o curto tempo de vida do Accord de geração anterior e é simples e engenhoso em medidas iguais.
Vamos começar pela teoria. O conjunto é formado por um motor 2.0 aspirado a gasolina e outros dois elétricos. Um deles atua como gerador, transformando a energia cinética do propulsor aspirado em elétrica. Assim, abastece a pequena bateria de 1 kWh posicionada logo à frente do eixo traseiro. O outro recebe essa energia e envia para as rodas – ou seja, é um motor de tração.
Conjunto híbrido do Honda Civic tem dois motores elétricos e um a gasolina
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Até aí, nada muito diferente de outros sistemas. O pulo do gato é que os motores a combustão e elétrico não atuam de forma simultânea para tracionar o Civic em quase nenhuma situação, ao contrário de híbridos como o Corolla.
“Em altas velocidades, seria necessário uma geração muito grande de energia elétrica, aumentando consideravelmente o consumo. Nessa condição, o motor a combustão trabalha com mais eficiência”, explica Maurício Corrêa, engenheiro da Honda.
Até por isso, a Honda não informa a potência combinada. O Civic pode ter 143 cv e 19,1 kgfm do 2.0 aspirado ou 184 cv e 32,1 kgfm do motor elétrico. Mas quando cada um funciona? Vamos lá. São três modos de operação. Na partida, o sedã é movido pelo motor elétrico usando a energia da bateria. É o chamado EV Mode.
Fluxo de energia é mostrado na central multimídia do novo Honda Civic
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Se a carga estiver baixa ou o motorista acelerar com mais vigor, a central eletrônica alterna para o Hybrid Mode. Nesse cenário, o motor 2.0 é acionado para alimentar a bateria e o motor elétrico de tração. Por último, quando o Civic está em velocidade de cruzeiro em uma estrada, por exemplo, o motor a gasolina se conecta a uma embreagem e passa a tracionar o veículo. Essa é a condição batizada pela Honda de Engine Drive.
Achou complexo? Aqui vão mais algumas informações. Apesar de esse conjunto de motores elétricos ser chamado de E:CVT, não há nenhuma caixa de câmbio. A atuação do motor a gasolina se dá por uma embreagem de relação fixa que funciona como uma espécie de Overdrive.
Novo Honda Civic tem um sistema híbrido diferente dos convencionais
Renato Durães/Autoesporte
Mas fique tranquilo porque todo esse gerenciamento é feito de forma automática e instantânea pelo que a Honda chama de PCU, ou Unidade de controle de potência. Só não diria que a transição entre esses modos é imperceptível porque o motor 2.0 deixa bem claro quando está funcionando.
Mas por que usar um motor tão grande se ele traciona as rodas por tão pouco tempo? A Honda diz que seria possível adotar um 1.5 ou até 1.0. Mas o 2.0 leva vantagem por trabalhar mais “relaxado” e em rotações mais baixas que as de um propulsor de menor capacidade volumétrica, garantindo maior eficiência. Vale lembrar que a Honda já usa o motor 1.5 nas versões híbridas de Fit e HR-V vendidos no exterior. No caso do Civic, um carro maior e mais pesado, o 2.0 compartilhado com o Accord faz mais sentido.
Cabine do Honda Civic de 11ª geração é mais refinado e elegante
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Antes de seguir, uma outra curiosidade do sistema. Na grande maioria das situações você ouve o ronco do motor, mas há um leve descompasso entre o ganho de velocidade e o aumento da rotação – e, como consequência, do ruído a bordo. Isso porque não há conexão entre ele e as rodas. Para atenuar esse efeito, que pode ser indesejado, a Honda adotou duas medidas.
Uma delas é o Active Sound Control, que emite um som de aceleração. A outra faz quase o oposto. É o cancelamento ativo de ruído, sistema que grava o som da cabine e reproduz uma frequência equivalente, mas oposta, para tornar o interior mais silencioso. Outras medidas para aumentar o conforto a bordo são o uso de um material emborrachado na capa do motor e de isoladores acústicos no coletor de admissão.
Honda Civic híbrido 2023 acelera de 0 a 100 km/h em 7 segundos
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Hora de colocar toda essa teoria em prática e levar o Civic 11 para a pista do TMT Campo de Provas. Vale lembrar que a Honda nunca divulga os dados de aceleração de seus carros, então não havia um número de referência oficial para criar a expectativa. E qual foi a minha surpresa ao receber a ficha com os 7 segundos cravados para ir de 0 a 100 km/h. O tempo é inferior ao do Civic Si de geração anterior e meio segundo abaixo do antigo Civic Touring 1.5 turbo.
O Civic 11 ainda superou o antecessor em todas as demais provas de aceleração, com exceção do tempo necessário para percorrer 1.000 metros, em que houve empate técnico. Nos ensaios de retomada e frenagem, a nova geração se saiu pior. Precisou de quase um metro a mais para conseguir parar a 80 km/h e 60 km/h.
A piora em alguns testes pode ser explicada pelo peso elevado do Civic 11. A nova geração é 120 kg mais pesada – é como se o motorista estivesse sempre com duas pessoas de 60 kg a bordo. E a culpa nem pode recair sobre a bateria, que só pesa 36 kg. A verdade é que, além dos componentes do conjunto híbrido, o motor 2.0 é maior que o antigo 1.5.
Honda Civic híbrido está um pouco maior em quase todas as dimensões – exceto na altura
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Nas dimensões, o sedã cresceu pouco – 4 cm no comprimento, 3 cm na largura e 3,5 cm no entre-eixos. O espaço interno continua muito bom, mas o túnel central elevado impede que o quinto ocupante viaje com pleno conforto. A saída de ventilação no console traseiro foi mantida, mas agora vem acompanhada de duas portas USB. Já o porta-malas encolheu 22 litros, oferecendo 495 litros para as bagagens.
A Honda diz que a nova geração tem rigidez torcional 8% maior com o uso de aços mais resistentes. Pela primeira vez, um Civic é construído com solda a laser – até por isso, dispensa os borrachões paralelos às portas no teto. O sofisticado recurso pode parecer novo, mas era oferecido no primeiro Volkswagen Polo nacional, 20 anos atrás – e também no popular Up, lançado em 2014. No Honda, não fazia falta. Mas agora é outra razão para o dono se vangloriar naquela conversa de bar.
Porta-malas do novo Honda Civic é 22 litros menor do que na geração anterior
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Se a intenção é essa, vamos oferecer mais alguns subsídios para o papo. O maior deles é que a dinâmica de condução continua sendo uma das melhores do mercado. Se o Corolla é sinônimo de conforto, o Civic sempre foi feito para quem gosta de dirigir. E a 11ª geração não foge à regra.
A direção com peso variável permite que o motorista tenha sempre controle do carro e um retorno do que se passa nas rodas. Na pista do circuito Panamericano até tentei provocar o sedã tailandês acelerando o mais cedo possível nas saídas de curva. Mas a única resposta que obtive do ótimo controle da carroceria e da suspensão com acerto ideal foi um carro apontando na direção correta, sempre na hora certa.
Painel do novo Honda Civic mostra uma reprodução do veículo, incluindo detalhes como setas ligadas
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Mas um Civic que é bom de guiar não é novidade para ninguém. Novo é o Honda Sensing, pacote de auxílios à condução, um dos mais avançados do mercado e estreante no sedã médio. Há frenagem automática de emergência, alerta de saída de faixa com correção no volante e faróis com facho alto adaptativo. O controlador de velocidade adaptativo, além das funções tradicionais como seguir o veículo da frente com uma distância pré-programada, ainda é capaz de parar completamente o Civic e retomar a marcha assim que o trânsito ficar livre novamente.
Aqui vale um adendo. O funcionamento do ACC é extremamente suave e competente. O motorista ainda pode conferir diretamente no quadro de instrumentos digital ilustrações que mostram veículos ao redor com silhuetas próprias para automóveis, motos ou caminhões. Uma curiosidade é que os limpadores trazem o jato integrado às palhetas. Segundo a Honda, essa mudança de posição economiza cerca de 40% de água.
Ar-condicionado do novo Honda Civic tem duas zonas e saídas escondidas por uma grade
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Para o conforto, há ar-condicionado digital de duas zonas, teto solar, bancos de couro com ajustes elétricos, acesso por chave presencial, partida por botão, retrovisor eletrocrômico e central multimídia com tela de 9 polegadas com Apple CarPlay sem fio e Android Auto (com a necessidade de conectar o aparelho por cabo).
Só que mais que qualquer tecnologia de conforto ou assistência ao motorista, o número que o futuro dono de Honda Civic não vai esquecer é o de consumo de combustível. Tome nota: segundo o Inmetro, o sedã marca 18,3 km/l na cidade e 15,9 km/l na estrada. Em nossos testes, os resultados foram ainda melhores, com impressionantes 26,9 km/l no ciclo urbano e 21,9 km/l no rodoviário. Considerando que o tanque de gasolina tem 40 litros, a autonomia na cidade pode superar os 1.000 km.
Durante nosso curto período de convívio, rodamos bem menos do que essa distância. E, apesar de ser um dos carros mais conhecidos e consagrados do mercado brasileiro, o sedã passou despercebido pelas ruas de São Paulo.
Gerações ímpares do Honda Civic costumam ser mais comportadas – com a nova, isso não muda
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Fiz questão de passar perto de exemplares mais antigos para ver se os donos percebiam ou perguntavam algo sobre a 11ª geração. Nada. Nem um simples aceno. Como costuma acontecer nas gerações ímpares do Civic, o visual é mais comportado. As linhas estão mais arredondadas e elegantes – deixando de lado aquela esportividade latente do modelo anterior. Há pouquíssimos cromados e a silhueta traz três volumes bem definidos, como nos sedãs clássicos. Uma oposição e tanto ao estilo fastback do Civic 10.
Com desempenho de carro esportivo, consumo muito melhor que o de modelos populares e tão equipado quanto um sedã de luxo, está mais que comprovado que o Honda Civic não é mais o mesmo – para o bem. Só que essa máxima também se aplica no aspecto negativo.
Honda Civic 11 tem traços de sedãs clássicos com três volumes bem definidos
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O modelo ficou tão refinado – e caro – que a lendária briga com o Toyota Corolla foi deixada de lado. A não ser que alguém resolva investir cerca de R$ 50 mil a mais para colocar o Honda na garagem. Se esse não for o caso, o Civic agora vai disputar mercado com SUVs, e não mais o de sedãs. Sejam eles a combustão, híbridos ou elétricos. Nesse cenário, os BYD Yuan e Song, o Kia Sportage, o Caoa Chery Tiggo 8 e o Peugeot e-2008 passam a ser concorrentes diretos – todos na faixa de R$ 240 mil a R$ 260 mil.
Mas nem que o antigo público do Civic resolvesse comprar a nova geração a Honda conseguiria atender aos pedidos. Como a produção na Tailândia ainda sofre com a falta de componentes, o volume de importações será restrito (a marca não disse quantas unidades devem chegar nos primeiros meses).
Até por isso as vendas serão limitadas a algumas cidades do Brasil. Inicialmente, serão doze: São Paulo, Campinas, Ribeirão Preto, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Goiânia, Brasília, Curitiba, Recife, Salvador, Fortaleza e Manaus. Se você vive em alguma dessas cidades e gosta do Civic, certamente terá um dos carros mais econômicos, confortáveis e refinados que essa quantia pode pagar.
Venda do Honda Civic 2023 será restrita a poucas cidades brasileiras neste primeiro momento
Renato Durães/Autoesporte
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