Nelson e Graça Prado saíram de Campinas, no interior de São Paulo, e rodaram mais de 5.000 km até os EUA Nos últimos tempos, Luiz Torelli, um viajante aventureiro, chamou bastante a atenção: natural de Nova Odessa, em São Paulo, ele foi do Brasil até os Estados Unidos dirigindo um Fiat Uno Mille 2002 (apelidado de Sandro). A viagem foi retratada diariamente nas redes sociais, especialmente no Instagram (@um.a.uno), com quase 300 mil seguidores.
O feito de Luiz (e do Sandro) é notável, sem dúvida, e totalmente merecedor de tamanho reconhecimento. Mas você já imaginou alguém fazer essa mesma viagem em um Uno Mille, do Brasil aos EUA, 30 anos antes, sem celular, GPS, internet, Waze, Google Maps, smartphone, Instagram, YouTube, Facebook nem nada disso? Pois é: alguém fez.
Sem celular, GPS, internet, Waze, Google Maps, smartphone, Instagram, YouTube, Facebook
Arquivo Pessoal/Acervo MIAU
A primazia coube ao casal Nelson e Graça Prado, que em março de 1992 saiu de Campinas, também em São Paulo, a bordo de seu Mille 1991, então com cerca de 5 mil quilômetros rodados, rumo aos EUA. As três filhas — Rafaela, Carla e Carolina — e outros familiares disseram, é claro, que eles estavam malucos. Mas a vontade de viajar e conhecer mais profundamente a América Latina falou mais alto.
Para ter uma ideia mais clara do que significava fazer uma viagem dessa distância naqueles tempos, tudo o que eles conseguiram para guiá–los foram alguns mapas em papel — que, descobriram depois, eram totalmente imprecisos e às vezes até incorretos. A maior parte das orientações pelo trajeto foram colhidas mesmo na base de placas de sinalização locais ou perguntando a quem estivesse passando pelo caminho.
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Rodaram até Campo Grande, depois Corumbá e de lá chegaram à Bolívia. Por um trem de carga no qual o carro foi embarcado alcançaram Santa Cruz de la Sierra e depois, por estradas, Cochabamba e La Paz. Muitos outros quilômetros à frente passaram por Lima, no Peru, foram até o norte do país e chegaram ao Equador — etapa na qual levaram dois dias para andar 35 km, por causa da queda de uma ponte que os obrigou a fazer um verdadeiro raid off-road debaixo de chuva.
Até lá o escapamento ficou pelo caminho duas vezes, os pneus furaram outras tantas e uma pedra danificou o tanque de combustível, mas o bravo Mille branco seguiu seu rumo.
Passando pela Guatemala
Arquivo Pessoal/Acervo MIAU
Engraçado mesmo foi que, ainda na Bolívia, a placa dianteira foi roubada; sem ter muito o que fazer, o casal instalou no lugar uma outra, decorativa, com o logotipo do time de futebol americano New York Giants, encontrada em uma loja local de lembrancinhas. E com ela o carro seguiu até o destino final!
O trajeto continuou de forma um pouco mais tranquila por Equador, Panamá, Costa Rica, Nicarágua, Honduras, Guatemala e México até chegarem aos EUA, por Brownsville, no Texas. De lá seguiram até Houston, depois Nova Orleans e finalmente Miami, onde o Mille foi embarcado em um navio para Santos, de volta ao Brasil.
Interessante é notar que, ao contrário do que costuma ocorrer nesse tipo de viagem de aventura, o casal não tinha qualquer conhecimento de mecânica e também não humanizou o carro, dando-lhe um nome; ele era tratado somente pela própria placa — BHI 1103.
Roteiro desde a saída do Brasil
Autoesporte
Nelson confessa que não só apenas concordava com a cabeça quando alguém fazia comentários sobre o Mille como esqueceu de conferir níveis de óleo e fluidos até o México — e só o fez por oferta do posto que lavou o carro, iniciativa tomada para que ele ficasse mais apresentável na hora de cruzar a fronteira com os EUA. “Esqueci. Estava de férias”, justifica.
O casal (que continua junto até hoje) manteve o Mille em uso até o início dos anos 2000, quando foi roubado e nunca mais visto.
Como ainda não havia máquina fotográfica digital na época, os registros acabaram sendo escassos — mas há alguns, como os reproduzidos aqui. E como também não existia Instagram nos anos 1990, a aventura foi contada em um livro, de papel mesmo, chamado simplesmente Viajando Brasil-E.U.A. de Carro. A tiragem foi bem limitada, mas você pode dar sorte de encontrá-lo em algum sebo perdido por aí. Mas há um exemplar, é claro, na biblioteca do Miau, o Museu da Imprensa Automotiva, disponível para consulta.
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