EDUARDO SODRÉ
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A cada automóvel novo vendido no Brasil entre janeiro e outubro, cinco modelos usados foram negociados. O dado, que é baseado nos resultados divulgados pela Fenabrave (associação dos revendedores), mostra o peso do segmento de carros de segunda mão.
Embora as 8,35 milhões de unidades negociadas neste ano impressionem, esse mercado está em queda. Na comparação com o mesmo período de 2021, há retração de 11,8%. Com isso, os valores cobrados começam a diminuir após um ciclo de aumentos.
Essa queda é recente. Segundo a KBB Brasil, empresa especializada em precificação de veículos, a média de valores cobrados por modelos seminovos (até três anos de uso) caiu 0,56% em agosto e 0,19% em setembro. No acumulado do ano, contudo, ainda há alta acumulada de 1,42%, reflexo das remarcações no primeiro semestre.
“O preço do seminovo valorizou bastante desde o ano passado, já que houve uma redução na oferta de veículos novos. Agora os valores têm se ajustado melhor à demanda do mercado”, diz Roger Laughlin, cofundador e CEO da Kavak.
O executivo lembra uma das razões do período de altas: a falta de semicondutores levou à escassez e ao consequente encarecimento dos modelos zero-quilômetro, o que se refletiu por todo o mercado.
Ao mesmo tempo, a alta na taxa básica de juros elevou os custos do financiamento.
“O crédito é hoje a mola propulsora do consumo, e vimos muitas das instituições financeiras restringindo o crédito devido à alta da inadimplência”, afirma Flávio Passos, vice-presidente de autos e comercial da OLX. “Quando pesquisamos os consumidores, vemos que existe muito interesse em comprar um carro, mas há necessidade de financiamento.”
Segundo boletim divulgado pela B3 na sexta (11), a taxa de inadimplência acima de 90 dias em contratos de financiamento (pessoa física) chegou a 5,18% em setembro. No mesmo mês de 2021, era de 3,42%.
Esse cenário aumenta as restrições dos bancos, o que dificulta a tomada de crédito. Um estudo divulgado pela OLX em outubro mostra que a maioria dos consumidores que têm interesse em adquirir um carro planeja comprar por meio de entrada e financiamento (38%), seguido de pagamento à vista (37%). Cerca de 10% dos 4.580 entrevistados pretendem financiar 100% do valor do bem, enquanto 8% preferem utilizar o consórcio.
Muitos desses compradores têm sido obrigados a refazer as contas. Em janeiro de 2020, antes da pandemia de Covid-19, um Toyota Corolla XEI 2015 era avaliado em R$ 66.482 na tabela Fipe. Um ano depois, o preço médio era de R$ 67.293, valor que saltou para R$ 85.447 em maio de de 2022. Agora a cotação para o mesmo carro é de R$ 84.060.
“Quem pensava em comprar um carro 2015 agora talvez tenha que comprar um 2013. Mais do que nunca, é necessário o apoio das instituições reabrindo o crédito, o que não tem acontecido neste fim de ano”, diz Passos. “A expectativa para 2023 é de que as coisas se normalizem, com retomada do emprego e redução do índice de endividamento das famílias.”
Enilson Sales, presidente da Fenauto (associação que reúne revendedores de carros usados), prevê que o mercado se normalize no próximo ano, com retorno do crescimento de vendas.
“Vínhamos crescendo mês a mês em 2022, mas tivemos um tranco em setembro e outubro que não foi provocado pela inflação ou por aumento de preços”, diz Sales. “O período eleitoral nos impactou, o consumo foi reduzido e o público ficou de espectador das notícias, mas a expectativa é de retomada.”
O presidente da Fenauto afirma ainda que o cenário econômico não foi tão ruim como o esperado neste segundo semestre, o que pode influenciar nos juros praticados em financiamentos. “Os bancos sempre trabalham antecipando o que vai acontecer, [projetando] um cenário de realista a pessimista para se proteger, mas as próprias áreas de crédito já começam a soltar as amarras.”
O apetite por oferecer mais crédito é visto nos números do C6 Bank, que lançou sua plataforma de financiamento no fim de 2021.
“Saímos de R$ 10 milhões em financiamentos em dezembro para algo por volta de R$ 400 milhões em outubro”, diz Ricardo Bonzo, head de financiamento da instituição.
“O revendedor tem facilmente quatro ou cinco opções de crédito para oferecer na loja, se não estiver em grau de competição com os principais players desse mercado, [o banco] estará fora.”
Segundo a B3, as vendas de veículos por meio de financiamento somaram 4,48 milhões de unidades entre janeiro e outubro. O número inclui motos, veículos leves e pesados, sejam novos ou usados. Em relação ao mesmo período de 2021, houve queda de 9,25% nessa modalidade de compra.
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